7 dicas para usar (bem)
metáforas e comparações
Todos
nós, em algum momento do ensino fundamental ou médio, aprendemos que a metáfora
é uma figura de linguagem utilizada quando substituímos um termo por outro que
não possui o seu sentido originário, criando uma ligação semântica antes
inexistente. E comparação é a figura em que se compara um elemento com outro,
dando-lhe um sentido conotativo. Em outras palavras, quando dizemos uma coisa
significando outra. Mas, para escritoras e escritores, elas podem ser bem mais
do que isso.
Para
os efeitos desse artigo, usaremos metáfora como sinônimo de comparação, mesmo
tendo a consciência que são figuras distintas.
O
que uma metáfora pode significar para quem escreve?
A
metáfora é a possibilidade de criar imagens, de moldar a imaginação, de tocar
os sentidos de quem lê, uma fonte de riqueza e beleza para o texto. Por
exemplo, nas duas sentenças: “enfrentava um monstro gigante, com vinte e cinco
metros de altura” e “enfrentava uma criatura imensa, uma montanha em
movimento”, a primeiro é uma descrição denotativa e expositiva sobre o tamanho
do monstro. Na segunda, percebemos que, com o uso da metáfora, conseguimos
evocar uma imagem e trazer informação sobre monstro – maciço, gigante e lerdo
-,enriquecendo o texto.
Porém,
se mal empregada, a metáfora pode também desvalorizar a obra, torna-la amadora ou, no minimo, preguiçosa.
Para
a literatura especulativa, a metáfora é um recurso essencial. Trabalhamos com a
criação de mundos, com coisas que não existem na realidade, com ideias místicas
ou tecnológicas que precisamos descrever e fazer com que leitoras e leitores as
experimentem e sintam. Trabalhamos com a imaginação. E as metáforas ajudam
muito a lidar com a imaginação.
Por
isso, trazemos sete dicas de como trabalhar bem suas metáforas.
1
– Evite metáforas batidas e genéricas
“Ela
era bela como uma flor”. Quantas vezes você já não leu ou ouviu isso? Bem, esse
é um exemplo clássico de uma metáfora batida, ou seja, metáforas tão usadas que
soam preguiçosas, repetitivas. Elas não atraem a atenção da leitora ou leitor,
parecendo que estão ali apenas para preencher um espaço. As metáforas batidas empobrecem o texto, pois
demonstram falta de empenho de quem escreveu em pensar um pouquinho mais sobre
o que descrevia.
Continuando
no mesmo exemplo: o que quer dizer ser bela como uma flor? Que era viva?
Perfumada? Colorida? Qual flor? Que imagem concreta, ou que ideia específica
essa metáfora dá sobre a personagem a que se refere? No fundo, quando paramos
para pensar, ela não diz muito sobre quase nada. Uma metáfora sempre deve vir
ao texto para dizer algo, passar uma ideia, um sentimento ou uma imagem. Se
está sendo usada sem um bom motivo e justificativa, ela é desnecessária e está
poluindo o texto.
Evite
metáforas comuns e, principalmente, aquelas que não acrescentam informação,
sentimento ou imagem. E procure surpreender e intrigar a leitora ou leitor com
a metáfora, usando comparações inusitadas, mas que façam total sentido dentro
do contexto. “Era bela como o choque de duas nebulosas”, funciona bem melhor,
especialmente considerando o tópico seguinte.
2
– Procure metáforas que sejam condizentes com a cena ou com a personagem que a
está usando
Muitas
vezes pensamos em uma metáfora linda, e queremos usá-la para aquele momento da
história. “Ela tinha a beleza de um vulcão em erupção” pode parecer uma
metáfora interessante, mas não será caso a história se passe em uma nave
espacial, após uma fuga de um Terra destruída, viajando para outra galáxia há
quatro gerações. Vulcões seriam coisas de livros de história que não fariam parte
do imaginário popular dessas pessoas. Uma metáfora que destoe do cenário e do
contexto pode afetar seriamente a Suspensão de Descrença da leitora ou leitor,
jogando-o um pouco para fora da história. No exemplo, se o narrador está
procurando uma comparação com um evento natural que seja belo e aterrorizante,
poderia usar a metáfora acima “Era bela
como o choque de duas nebulosas”, dentro do contexto de ficção cientifica
espacial.
Claro
que o contexto da história pode e deve ser mais complexo. Digamos que o
narrador seja uma personagem que é aficcionada pela história e fenômenos
naturais da Terra, especialmente vulcões. Isso foi desenvolvido durante a
história. Nesse caso, seria cabível e não fugiria ao contexto o exemplo da
beleza de um vulcão em erupção, pois está sendo usado por uma personagem para
quem essa imagem, essa metáfora, significa algo e tem intensidade.
É
interessante pensar em usar metáforas que estejam dentro do contexto. Em uma
história que se passa no mar, as metáforas podem ser aquáticas, molhadas,
vastas como o oceano, por exemplo.
3
– Use metáforas sinestésicas
“Quando
nos aproximamos, senti em seus cabelos o cheiro do vento”. A sinestesia é a
mistura de sentidos que não são óbvios. Ou seja, quando você cheira uma cor, vê
um sabor, tateia um som. A sinestesia é um grupo forte das metáforas, com uma
pegada poética muito interessante, além de surpreender e intrigar a leitora ou
leitor. Elas funcionam perfeitamente quando ajustadas ao contexto e,
principalmente, à personagem que a sente. Escolha o sentido mais relevante para
aquela personagem e a faça sentir a partir dele. Faça correlações que possam
dizer algo sobre aquela personagem, sua personalidade, suas vontades. Sentir o
cheiro do vento nos informa, por exemplo, que sentido do olfato é presente na
vida dessa personagem, e a metáfora do vento nos traz a ideia de liberdade e
dos cabelos soltos.
A
sinestesia pode ser sua amiga. Abrace-a! E use com sabedoria.
4
– Tente ir além da metáfora
Metáforas
significam algo. Elas dão um sentido mais profundo, um polissignificado para
determinada passagem. Dizem sobre estado de espírito, sobre o que a personagem
vê e sente além do básico e descritivo. Quando você usa metáforas, você cria um
vínculo entre aquelas imagens, entre aqueles significados com as suas
personagens e os cenários. Aprofunde isso, faça com que a leitora ou leitor
sinta essa ligação. Use as metáforas para trabalhar esse aspecto poético e
lúdico da personalidade, o sentimento de uma maneira tangente e singela, ou
mesmo bravia e tempestuosa. Explore essa possibilidade. Isso pode dar
profundidade ao texto. Apenas tome o cuidado de não exagerar. Tudo demais
cansa.
5
– Não seja preguiçoso e não tenha pressa
Essa
é uma dica bem direta. Não seja preguiçoso em procurar a metáfora certa. Tente,
pense, planeje. Procure a exata metáfora que você precisa para aquele momento,
para a construção daquela cena. Isso pode levar um tempo e pode ser que você
tenha que marcar a passagem e revisita-la. Não tenha preguiça de procurar o
texto perfeito, mas também não tenha pressa para acaba-lo de qualquer jeito. A
escolha de uma boa metáfora exige uma ponderação e um conhecimento profundo do
que se quer escrever. E tenha paciência para mudá-la quantas vezes for
necessário.
6
– Revise e veja se realmente funcionou
Quase
sempre, é mais trabalhoso revisar um texto do que escrevê-lo. As revisões podem
se estender ao infinito, pois sempre haverá algo que você mudaria. Isso poderia
ser uma dica geral, mas em relação às metáforas, é preciso ficar muito atento
se a execução foi realmente bem feita. Lembre-se, uma metáfora ruim é um
caminho certo para desfazer aSuspensão de Descrença de quem está lendo. Por
isso, é importante revisar e ter discernimento o suficiente para saber se sua
metáfora, por mais linda que seja, está funcionando naquele contexto.
7
– Tenha desapego com sua metáfora
Aí
você escreveu a melhor metáfora do mundo. Ela é perfeita, uma imagem belíssima,
uma construção textual genial. Mas, ao lê-la na história, percebe que ela não
se encaixa bem no contexto e, sinceramente, a leitora beta também disse que nem
ficou tão genial assim.
Metáforas
são um apelo ao emocional e à imaginação. Por isso, é fácil que nosso
envolvimento, enquanto autoras e autores, não nos deixe perceber que ela não é
ideal, ou então, mesmo percebendo, achamos que pode passar, forçando um pouco a
barra.
É
uma decisão difícil, mas é importante ter desapego a sua metáfora. Deixe-a
guardada em uma anotação separada. Garantimos que ela pode ser útil
eventualmente. Mas não a force em um texto que ela não está funcionando
perfeitamente. Você não apenas vai estragar uma metáfora que gostou tanto, mas
também vai deixar sua história aquém do que ela poderia ser. Praticar o
desapego é importante, inclusive na literatura.
No
mais, divirta-se escrevendo. Algumas metáforas malucas também podem ser
interessantes. E lembre-se, nenhuma regra ou técnica é imperativa. Você é livre
para não usá-la, se assim achar melhor.
Tem
mais alguma dica em relação às metáforas? Quer dividir seus truques com a
gente? Deixa aí nos comentários =)